Pesquisa realizada com mais de 300 empresas aponta que o assunto ainda é tratado como tabu. Fórum buscou ajudar profissionais a lidar de forma mais profissional com o tema
Luto é uma palavra que na maioria das vezes é associada à morte. Tanto que este assunto é tratado como tabu em quase todos os setores da sociedade e mais ainda no ambiente de trabalho.
Intitulado “Melhores Práticas para lidar com o Luto no Ambiente Profissional”, o estudo foi coordenado pelo psicólogo e consultor Bernardo Leite e apontou de forma geral o comportamento das empresas diante da situação de luto.
Ele destacou alguns pontos da pesquisa:
- A receptividade dos respondentes foi alta, com mais de 300 participantes;
- Embora alguns benefícios estejam previstos na CLT, não foi unânime a resposta ao atendimento às situações de luto, com 81,6%;
- Quase metade dos respondentes (44,4%) apontou uma percepção indiferente ou negativa das ações da empresa diante dos últimos eventos de luto ocorridos internamente;
- Mais de 70% dos participantes que avaliaram positivamente a forma como a gestão lida com o luto apontaram o apoio psicológico e as homenagens prestadas pela empresa como fatores de avaliação positiva das ações tomadas pela organização;
- Outra prática comum é o envio de coroa de flores, apontado por 55,2% dos respondentes
Bernardo Leite ainda ressaltou que há muita falta de informação por parte dos gestores e profissionais de Recursos Humanos sobre como lidar com o assunto por ser tratado como tabu e o atendimento ao funcionário que passa por situação de luto é feito quase como um “apagar incêndio”. “Não há uma preparação, um cuidado, uma política de atendimento a esses casos e é uma pena porque o tema tem uma influência enorme nas questões de cultura e do ambiente organizacional, o que traz à tona a necessidade de preparação da empresa para essa prática”, analisou.
Para aprofundar o tema, foi realizado no início de dezembro o Fórum Humanize, evento voltado para empresários, gestores de pessoas e profissionais de RH, que contou com a participação do embaixador da Associação Chapecoense de Futebol, Jakson Follmann, ex-goleiro sobrevivente do acidente aéreo de 2016; da presidente da Associação Brasileira de Parentes e Amigos de Vítimas de Acidentes Aéreos – ABRAPAVAA, Sandra Assali e da psicóloga especialista em luto, Mariana Clark.
Follmann hoje faz um trabalho em uma clínica de próteses e órteses de Chapecó (SC) ajudando pessoas a superarem o trauma da perda de um membro do corpo. Afinal, a perda também é uma situação de luto. “A vida não pode parar, de modo que procuro sempre estar envolvido, estar com a cabeça ocupada e sempre ajudar as pessoas. É um trabalho gratificante porque meu papel é tranquilizar o paciente que fica desnorteado no início do processo”, relata.
Mariana Clark, que vem trabalhando com as famílias vítimas do acidente de Brumadinho (MG), ressalta que as empresas devem ter menos salas de descompressão — espaços oferecidos no ambiente de trabalho para as pessoas aliviarem o estresse e a ansiedade — e promover mais rodas de conversas. “É preciso dar um passo atrás e encontrar novos caminhos para tratar as dores e criar ambientes onde as pessoas possam expressar e validar suas dores. As rodas de conversas e palestras com especialistas têm sido muito utilizadas para que as organizações deem um primeiro passo para implantar um programa que esteja dentro de uma filosofia de saúde integrada e criar um ambiente mais humanizado”.
Ela conta que são duas equipes que trabalham em Brumadinho no atendimento aos funcionários e familiares e às lideranças que participam de workshops de preparação para lidar com o cenário pós-trauma gerado por um desastre como o ocorrido na barragem da Vale.
Com experiência de ter atendido familiares de vítimas de mais de 200 acidentes aéreos, a advogada Sandra Assali explica que tudo o que é relacionado esses desastres é complexo, por envolver duas investigações — aeronáutica e criminal, e os familiares ficam desnorteados e nem sabem quais direitos têm. “Hoje levamos nossa experiência para outras tragédias coletivas e ajudamos as empresas a se prepararem para esse momento, tanto que oferecemos suporte para gestão de crises”.
A advogada conta que seu marido, um médico cardiologista, foi uma das vítimas do acidente da TAM em 1996 e a empresa em que ele trabalhava, o laboratório farmacêutico Boehringer Ingelheim demonstrou um grande preparo para lidar com a perda, já naquela época. “Poucas horas depois da notícia, estavam na minha casa o presidente da empresa, o diretor de RH, um médico e um psicólogo que ficaram à disposição o tempo todo para mim. Esses gestos geram segurança, acolhimento necessário, solidariedade e demonstração de respeito às famílias das vítimas”, pondera.